quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Estado de atenção


E de nada me adianta falar enquanto se recusam a ouvir. De que serve escrever se o mundo está analfabeto. Todos os que estão à nossa frente nos querem analfabetos. Não são as apostilas escolares que nos ensinam a ler. Não se lê com os olhos. Estão nos deixando cegos e estamos vendo apenas o que querem que vejamos. E acatamos isso como certo. E erramos. Já não sei nadar. A correnteza é forte demais. Irresoluto luto e vou contra a maré. A contragosto de todos. E afundo. E aqui no fundo perco os sentidos e vejo tudo mais claramente. Mas a água salgada machuca meus olhos. Transformou-se água em sangue. E ainda assim não acreditaram. Escrever tornou-se hipocrisia. Guerra condecorou-se arte.
E eu estou cansado de ver o mundo em terceira pessoa. Impotente. Não sei ao menos encerrar a goteira renitente na pia do meu banheiro. Como posso querer solucionar o caos mundial? Dentro de uma cúpula de vidro observo um mundo livre cheio de possibilidades pronto a ser vivido. E eu o amo sem necessidade de recompensa, e o desejo. Gratuitamente. Mas o vidro embaça-se, e em vez de uma vez por todas quebrar esta barreira, e o mundo e eu então passar a sermos peremptoriamente um só, tudo que faço é tirar minhas vestes, e nu diante do mundo, resignadamente limpo os vidros. E permaneço a ver longe a límpida liberdade. E a goteira da minha pia pinga na minha testa. E agora eu mudo a cama de lugar.
E a cúpula sou eu. Sou todo de vidro vendo o mundo através de mim. Estou  baço. E tão fraco tornei-me que qualquer movimento em mim, parte-me esmiuçadamente em milhares de esquírolas de vidro. E partido sou forte. E aquele que atreve-se a pisar, se fere. E espalha seu cruor onde já não sei circunscrever onde estou. Onde foi parar o mundo. Foi declarado estado de atenção em todas as regiões.

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