Efeméride.
Ele que não conhecia o mar. E de nada sabia do amor. Sequer havia sentido o sal do mar, e o sabor de amar. Conheceu-o no mar e instantaneamente amou.
Surgiu das ondas. Pele alva, boca rosada. O tipo de homem que se alguém dissesse que havia visto, certamente jamais acreditaria que pudesse existir tamanha beleza. Mas o viu com seus olhos. E seus olhos o sorriram em retribuição. Ele precisava experimentá-lo. Porém, logo refletiu-se um escudo inexorável separando-os. Um escudo em formato de anel no dedo anelar. Mas como sátiro que era, havia desejo em todo seu corpo. E dedicou-se a isso. E como fera, atraído fora pelo feromônio que de certo fere, o deixando em fúria, já que ele se foi.
E no desejo mais íntimo de se conhecer, saiu a navegar por mares desconhecidos, sem perceber que seu reflexo refulgia límpido nas águas escuras e tão próximas. Bastava fechar os olhos. Embuste. Saiu a se procurar em outros corpos. Passando à libar espíritos. E quanto mais fundo mergulhava, mais longe se fazia de si. Mas já estava embebido de algo que acreditava ser o "eu-desconhecido". E quanto mais bebia, mais via o quanto não se conhecia. Espíritos doces, amargos. Suores salgados. Alcoolizado. Cheiro de café que inebria. Tornou-se vício.
Enquanto isso os peixes dormem em aquários minúsculos dentro de sua mente. Não há como sentir falta do que não se conhece. Nasceram em cativeiro. Para viver sem ambição ou, por mais volição. Contentam-se. Se cego fosse desde o primeiro vagido, como saberia a imensidão azul do mar? Mas uma vez conhecido, jamais olvidariam o que se ouviu no fundo do oceano.
E me encontro diante da fronteira de minhas verdades veementes e veleidades de minha mente. E não há outra opção. Mente.
E quando retorna a superfície, e ele o toca e a náusea o toma. Quando você beija suas costas, e passa sua barba por fazer no seu corpo, os arrepios são de puro asco. E tudo e toda emoção é de repulsa, choro contido. Por se sentir refugo de um mundo imundo. E ele já não tem forças para lutar. Quando ele diz não, ele realmente quer dizer não. E você nunca o ouve. Pior que você, é ele. Esquálidos espíritos. Covarde. Outorga que o invada. Seus beijos de olhos abertos. Seu corpo entregue. Experimentou seu espírito sem escrúpulos. Indecoroso. Porém cheio de volúpia e de algo que você acredita ser amor. E ébrio com seu espírito e confuso com o tato de sua pele, sua língua asquerosa, sua respiração ofegante, ele cede para depois se arrepender. E finalmente quando acaba ele quer apenas que você saia de cima dele, deseja que finalmente seu espírito se esvaia e o deixe em paz. Que não o toque. E quando ele toma banho esfrega-se a ponto de ferir-se, desejando tirar a pele que que o recobre e o cheiro de carne podre que insiste em permanecer grudado, aprisionado. Mas agora há algo seu perene nele. E ele sabe.
O cheiro de sexo sem vontade continua em seu quarto. Nauseabundo. E você já não sabe se esse cheiro de merda está na cama ou impregnado em você. E o que peremptoriamente permanece em você é algo tão negativo que diante de exames é constatado. Soro positivo. Pacto de sangue. Agora só resta um ao outro. Lua cheia. E como um lobo ululante, dentro do quarto, como uivo ele chora, alto e descontrolado que dói no peito. Físico.
Diante do mar vê seu castelo de areia desmoronar pelo traiçoeiro amar. Diluído em drogas coradas e pigmentadas em um rubro grosseiro disperso em esquálido papel higiênico. Onde a evolução humana é simples esboço de pinturas rupestres transpostas em pena que por pena do esforço vieram a tornar-se letras sem vida do dedilhar humano da máquina de escrever, e onde a indolência levou o primata contemporâneo a digitar o que o escriba deixou em rascunho do que seria, ou viria à tornar-se a vida moderna, quando por efeito daquelas pensou com mais clareza. O apolíneo apoplético em seu apogeu apoiado pela apófase apoditicamente apodreceu pela apologia apócrifa apontada como apocalíptica.
Em tal vezo talvez vejo que foi assim que se tornou... Efeméride.
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